Relator de processos envolvendo o Banco Mercantil do Brasil, o ministro do STF José Antonio Dias Toffoli obteve empréstimos de valor milionário da instituição financeira. Ao todo, foi R$ 1,4 milhão em operações de crédito a serem quitadas em até 17 anos.
Com sede em Minas, o banco de médio porte chegou a dar desconto nos juros dos dois empréstimos realizados pelo magistrado. Esse desconto assegurou uma economia de R$ 636 mil a Toffoli. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo, em matéria assinada pelos jornalistas Fábio Fabrini e Andreza Matais.
Segundo o CPC, o CPP e o Regimento Interno do STF, cabe arguir a suspeição do magistrado por parcialidade quando alguma das partes do processo for sua credora. Toffoli relata ações do Banco Mercantil desde que assumiu a cadeira no Supremo, em 2009. Dois anos depois, ele obteve os dois empréstimos, numa operação considerada "pouco usual" até por funcionários do banco.
No STF, Toffoli relata processo em que o Mercantil tenta ser compensado por contribuições que, no seu entendimento, foram feitas em porcentual maior que o devido ao INSS.
Em junho de 2011, três meses antes do primeiro empréstimo, Toffoli negou recurso do Mercantil nesse processo. Segundo ele, não cabia reapreciação do caso, com base na jurisprudência do tribunal, por se tratar de "coisa julgada" em definitivo.
Depois de concedidos os dois empréstimos, em janeiro de 2012, ao analisar um agravo regimental do banco, o ministro suspendeu o processo até o julgamento de outros dois recursos nos quais foi reconhecida repercussão geral de questão similar à discutida, ou seja, a possível relativização de "coisa julgada".
A repercussão geral é um instrumento que permite ao Supremo selecionar determinado recurso, considerado relevante, para julgamento. A decisão nesse recurso poderá ser aplicada pelas demais instâncias do Judiciário em casos idênticos. O uso desse mecanismo reduz a quantidade de processos enviados ao STF.
Em outro processo sob relatoria de Toffoli, o Mercantil questiona lei que aumentou de 3% para 4% a alíquota da Cofins sobre o faturamento de bancos. O processo foi distribuído ao ministro em 16 de setembro de 2011, 14 dias depois de feito o primeiro empréstimo. Em 28 de novembro do mesmo ano, ele reconheceu repercussão geral no caso.
Mais detalhes
* O primeiro empréstimo, de R$ 931 mil, foi concedido em setembro de 2011, em 180 parcelas fixas de R$ 13,8 mil, a serem pagas até 2026. Conforme escritura da operação, registrada em cartório, Toffoli deu como garantia de pagamento sua casa no Lago Norte, em Brasília.
* Liberado três meses depois, o segundo crédito, de R$ 463,1 mil, teve pagamento definido em 204 prestações fixas de R$ 6,7 mil, com vencimento até 2028. Para assegurar o pagamento da dívida, o banco aceitou o mesmo imóvel de Toffoli, fazendo uma "hipoteca em segundo grau".
* Em ambos os casos, os juros fixados foram de 1,35% ao mês.
* As parcelas inicialmente definidas nos contratos somavam R$ 204 mil, mais que a remuneração líquida de Toffoli no Supremo à época, que girava em torno de R$ 17,5 mil.
* Em abril deste ano, após decisões do ministro em processos do Banco Mercantil, as duas partes repactuaram os empréstimos, por meio de aditivos às cédulas de crédito originais e transcritas em cartório. Conforme os registros, o banco baixou a taxa para 1% ao mês.
* Com a alteração, a soma das prestações caiu para R$ 16,7 mil mensais - um comprometimento de 92% dos ganhos atuais do ministro no Supremo.
Mais que VIP
O jornal O Estado de S. Paulo consultou dois gerentes da agência responsável pelo relacionamento com Toffoli, em Brasília. As taxas oferecidas para empréstimo de mesma natureza a "clientes VIP" variaram entre 3% e 4% ao mês, com parcelamento em, no máximo, quatro anos.
O superintendente do Mercantil em Brasília, José Alencar da Cunha Neto, afirmou que a redução de juros, nas condições descritas nas escrituras do negócio, é atípica: "Não saberia dizer o que aconteceu com a negociação. Confesso que não é muito usual".
Contraponto