Valores sacados em proveito próprio por viúva terão de ser ressarcidos, pois ela excedeu os poderes que lhe foram concedidos pelo ex-marido por meio de procuração.
A decisão é da 17ª Câmara Cível do TJRS, em favor da filha e herdeira do falecido.
O ressarcimento exclui os saques de valores comprovadamente utilizados para pagamento de despesas com o tratamento médico do mandante durante sua hospitalização.
Caso
A autora ajuizou ação alegando que seu pai outorgou à ré - sua esposa com quem casou com separação total de bens obrigatória em virtude de estar com 91 anos e ela, sua então enfermeira, com 55 anos na data do casamento (art. 1.641, CC) - procuração pública para movimentar contas em seu nome no Banco do Brasil.
Referiu que, após a hospitalização do outorgante, a ré efetuou diversos saques de valores consideráveis, totalizando cerca de R$ 210 mil, apropriando-se do dinheiro como se fosse seu, sem ter prestado conta da utilização da quantia ao outorgante e tampouco à sua filha e herdeira.
Requereu o bloqueio das contas da ré em antecipação de tutela e a restituição do dinheiro sacado indevidamente.
A antecipação de tutela foi deferida e, quando do julgamento do mérito, a sentença foi pela procedência parcial da pretensão.
Ao decidir o caso, a Juíza de Direito Gladis de Fátima Ferrareze, de Porto Alegre, condenou a ré a restituir à autora os valores sacados indevidamente das contas existentes em nome de seu pai. No entanto, previu o desconto das despesas médicas comprovadas. Tudo corrigido monetariamente.
Insatisfeita, a ré apelou ao Tribunal sustentando ser equivocada a presunção de que seu falecido esposo, apenas porque tinha 94 anos e estava internado em hospital, não possuía capacidade física e mental para gerir e responder por seus atos.
Alegou que os valores retirados do banco, além dos relacionados ao pagamento das despesas hospitalares, foram devidamente autorizados pelo falecido, seu marido, que estava preocupado com a estabilidade financeira futura da esposa.
E acrescentou ser desnecessária a prestação de contas entre cônjuges.
Apelação
Ao julgar o recurso, a Desembargadora Liége Puricelli Pires, relatora, afirmou não ter identificado elementos no sentido da comprovação da incapacidade mental do outorgante do mandato.
Segundo ela, no caso de vigência da tese acerca da ausência de capacidade para a outorga do mandato, os saques e cheques destinados ao pagamento de despesas médicas, efetuados pela ré, também seriam nulos.
Apesar disso, a magistrada chegou à conclusão bem semelhante a da sentença, ainda que por outro fundamento: excesso de mandato.Pelo mandato, o mandatário se investe na condição de representante do mandante, obrigando-se a praticar ato ou administrar interesses apenas em nome de quem lhe outorga o poder, poder este que nunca pode ser ilimitado, diz o voto da relatora. No caso concreto, tendo a ré excedido os poderes do mandato que lhe foi conferido quanto à movimentação financeira do falecido enquanto este se encontrava hospitalizado, na medida em que sacou vultosos valores em seu proveito próprio - R$ 120 mil - está-se frente a excesso de mandato.
A relatora destacou, ainda, não haver prova cabal no sentido de que o falecido doou à ré valores que se encontravam em sua conta bancária com a finalidade de que essa se estabilizasse financeiramente após sua morte.
A tese acerca da doação é isolada e mostra-se inverossímil porque, quanto ao bem que o falecido quis deixar para a ré, qual seja o apartamento onde viviam, foi-lhe devidamente testado, observou. Assim, deve a mandatária responder pessoalmente pelo excesso, na forma do artigo 663, do CC.
Participaram da sessão de julgamento, além da relatora, os Desembargadores Luiz Renato Alves da Silva e Bernadete Coutinho Friedrich.
Texto: Ana Cristina Rosa
Assessora-Coordenadora de Imprensa: Adriana Arend
Fonte: Site do TJRS
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