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A atriz Isis Valverde, mineira, de 26 anos, venceu em primeiro grau uma ação que move desde 2007 contra a Editora Abril, por publicação não autorizada de fotos com os seios à mostra - na revista Playboy.
Em abril de 2007, a revista estampou na coluna ´Click´ imagens da atriz parcialmente desnuda, em uma gravação de "Paraíso Tropical", de Gilberto Braga. A legenda dizia que “Isis Valverde, no Rio, dá adeusinho e deixa escapar o cartão de boas-vindas”. Na novela, ela fazia o papel da prostituta Telma.
De acordo com a sentença da juíza Katia Cilene da Hora Machado Bugarim, a Abril terá que pagar R$ 40 mil. Cabe recurso de apelação ao TJ do Rio.
Isis foi flagrada por um paparazzo a serviço da New Agência Fotográfica Ltda., quando ficou parcialmente nua, acidentalmente, enquanto gravava uma cena externa, nos Arcos da Lapa, região central do Rio de Janeiro. Além do uso indevido da imagem, o processo questionou o uso de texto difamatório e inverídico junto à referida fotografia.
A agência vendeu a foto à Abril, que a inseriu na revista Playboy. Reiteradamente ao longo de sua carreira, a atriz repetiu que recusava-se a posar nua.
A sentença descreve que "Isis teve de interpretar cena onde sua personagem perdia o equilíbrio e caía do parapeito dos Arcos da Lapa, vindo a 'falece'.Para a gravação dessa cena foi providenciado grande aparato a fim de garantir a incolumidade física da atriz, mas num desdobramento de uma das cenas muita vezes repetida, ela ficou com os seios à mostra".
A juíza observa que "o fato de a autora ser atriz de tevê e ter notoriedade não afastam o seu direito à intimidade e ao pudor, salvo se por mera liberalidade abrisse mão disso, o que não ocorreu no caso".
O advogado Marcelo Miguel Martins atua em nome da atriz. (Proc. nº 0104967-50.2007.8.19.0001).
Leia a íntegra da sentença
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
JUÍZO DE DIREITO DA 42ª VARA CÍVEL DA CAPITAL
Processo nº 0104967-50.2007.8.19.0001
Ação: Indenização
Autora: Isis Nable Valverde
Ré: Editora Abril S/A
SENTENÇA
Trata-se de ação de indenização, pelo rito ordinário, movida por ISIS NABLE VALVERDE em face de EDITORA ABRIL S/A, todos devidamente qualificados nos autos. Aduz a autora na inicial e emenda de fls. 115/118, em resumo, que é atriz contratada pela TV Globo; que recentemente teve importante participação na novela ´Paraiso Tropical´, onde interpretava a personagem Telma; que em março de 2007 teve de interpretar cena onde sua personagem perdia o equilíbrio e caía do parapeito dos Arcos da Lapa, vindo a falecer; que para a gravação dessa cena foi providenciado grande aparato a fim de garantir sua incolumidade física; que inexplicavelmente a ré publicou na revista Playboy e sem sua autorização foto tirada no momento da gravação onde a demandante aparece com os seios à mostra e acrescentando à referida fotografia texto difamatório e inverídico; que a imagem também está disponível no site eletrônico da revista Playboy para consulta pública; que o fato vem lhe causando enormes problemas e constrangimentos; que a imagem tal como foi veiculada traduz comentários de cunho malicioso e indecoroso que não possuem qualquer relação com as atividades da demandante; que não se deixou fotografar com os seios à mostra como afirmado pela ré; que o fato lhe causou grande indignação; que a ré fez uso indevido de sua imagem com o intuito de fomentar o aumento das vendas de sua revista; que o texto veiculado pela ré possui natureza sensacionalista e objetivos comerciais; que possui contrato de total exclusividade quanto aos direitos autorais obtidos pela gravação de seus personagens e sua utilização indevida pode ocasionar sua rescisão.
Enfim, requer a condenação da ré no pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 49.400,00, ou em outro quantum de acordo com o entendimento deste juízo, indenização por danos morais e a retirada da imagem do seu site e de qualquer outro endereço eletrônico de sua propriedade até decisão final da lide, pleito que espera ver acolhido em sede de tutela antecipada.
A inicial veio acompanhada dos documentos de fls. 36/102. A tutela antecipada foi deferida (fls. 104/105). A ré apresentou contestação (fls. 123/145) onde inicialmente requer a denunciação da lide à empresa New Agência Fotográfica Ltda ME. No mérito sustenta, em resumo, que não praticou qualquer ato ilícito; que foi autorizada a inserir a imagem da autora na revista Playboy; que somente utilizou a imagem da demandante porque adquiriu a fotografia da empresa New Agência Fotográfica Ltda ME, mediante contrato de cessão de direitos autorais; que a exploração da imagem foi autorizada pela própria autora; que o uso da imagem mostra-se legal diante do contexto em que foi obtida a fotografia; que a fotografia foi extraída em local público e houve divulgação da data e local da gravação da cena, o que permitiu que grande número de pessoas comparecesse ao local acompanhados de fotógrafos que retrataram a atuação da autora, não havendo qualquer ilicitude em tal fato em razão da notoriedade da demandante; que não houve ofensa ou inverdade na expressão inserida na fotografia. Enfim, sustenta a inocorrência dos danos materiais e morais, cita doutrina e jurisprudência em abono a sua tese, impugna especificamente os pedidos e pugna pela improcedência. A resposta veio acompanhada dos documentos de fls. 146/186. Réplica às fls. 192/207. As partes se manifestaram em provas (fls. 210 e 211/219).
Sentença às fls. 221/224 acolhendo a pretensão autoral.
Inconformada a ré interpôs recurso de apelação (fls. 226/249). Ao qual foi dado provimento com a anulação do processo a partir da sentença e o deferimento da denunciação à lide (fls. 291/297). Citada a denunciada apresentou contestação (fls. 338/350), sustentando, em preliminar, sua ilegitimidade passiva, eis que não possui o poder de negociar a licença para a exibição ou publicação da imagem de artista do gabarito da autora, sendo certo que a responsável pela publicação indevida da imagem foi exclusivamente a denunciante.
No mérito assinala, em resumo, que pactuou com a denunciante contrato de adesão de cessão de direitos autorais sobre obras fotográficas onde a denunciante estipulou todas as regras, não lhe conferindo alternativas na ocasião da assinatura do pacto; que assim sendo restaram mitigados os princípios da autonomia da vontade, obrigatoriedade e relatividade dos efeitos contratuais e desequilíbrio entre as partes envolvidas tendo em conta o poderio econômico da denunciante; que de conformidade com o Código Civil em vigor as cláusulas ambíguas devem ser interpretadas de modo mais favorável ao aderente; que não houve boa-fé da denunciante na formulação e execução do contrato, tanto que violou direito de terceiro, realizando também afirmação inverídica sobre o contexto da fotografia; que o contrato em questão dever ser restrito a hipóteses referentes ao direito autoral, não se admitindo interpretação extensiva para se concluir que a contestante obteve autorização para o uso da imagem da autora, quando à lide principal destaca que a fotografia foi tirada em local público e com finalidade exclusivamente informativa.
Enfim, requer a improcedência da denunciação bem como da lide principal. A contestação da denunciada veio acompanhada com os documentos de fls. 352/357. Réplica pela autora às fls. 361/364 e pela denunciante às fls. 365/373. Em atenção ao despacho de fls. 374 a autora e a ré manifestaram desinteresse na produção de outras provas (fls. 379/381 e 383/384). Enquanto a denunciada protestou pela produção de provas documental e testemunhal (fls. 376/377).
Mais adiante, contudo, manifesta desinteresse na produção de provas (fls. 388/389 e 394/395). Encerrada a instrução as partes apresentaram alegações finais por meio de memoriais, oportunidade em que reafirmaram seus pontos de vista já conhecidos, estando o memorial da denunciada às fls. 468/481, da autora às fls. 482/486 e da ré às fls. 487/497.
Relatei.
Passo a decidir.
Pretende a autora seja a ré condenada a lhe pagar reparação por dano moral e material, além de obrigação de fazer pelo uso inconsentido de sua imagem em revista editada pela ré, de ampla circulação e destinada ao público masculino.
A demandada, por sua vez, nega a ocorrência de ilícito alegando, em suma, que a fotografia publicada foi obtida em local público e a autora autorizou o seu uso. Ademais, a publicação não tinha cunho comercial, mas meramente informativo. É incontroverso que a edição n. 383, da revista Playboy, publicada em abril de 2007 estampou na coluna Click, sob a legenda ´fotos indiscretas de PLAYBOY´ fotografia da autora com um dos seios desnudos e logo abaixo o seguinte texto: ´ISIS VALVERDE, no Rio, dá adeusinho e deixa escapar o cartão de boas-vindas´ (fl. 165).
Também não se discute que referida fotografia foi obtida quando a autora gravava cena de telenovela e por um incidente um dos seus seios ficou à mostra. Sendo certo que o contexto da cena nada tinha a ver com a exploração do corpo ou da sensualidade feminina. Mas sem dúvida alguma foi essa a conotação dada pela revista editada pela demandada.
A autora não estava participando de ensaio fotográfico sensual, tampouco se deixou fotografar seminua expondo-se à curiosidade alheia em local público. Logo não estava a ré autorizada a publicar sua imagem captada em momento infeliz, o qual qualquer mulher está suscetível, e sem a devida e imprescindível autorização, quanto mais em revista cujo público alvo sabidamente não está interessado em assuntos novelísticos, o qual a revista sequer faz menção, mas nas imagens de apelo erótico e sensual de corpos femininos nus e seminus, cujo conteúdo nada tem de informativo. No caso o que se procurou explorar foi a nudez parcial da autora, embora contra a sua vontade, e com o objetivo de auferir lucro.
A preservação da imagem da pessoa, seja ela famosa ou desconhecida, está garantida pela ordem constitucional e infraconstitucional, bem como o seu direito à reparação no caso de violação, conforme enunciado no art. 5º inciso X, da CF. A violação ao direito de imagem da autora é inquestionável, visto que a ré não detinha autorização paro o seu uso.
Em se tratando de uso indevido de imagem o dano decorre do próprio fato, sendo desimportante que venha ou não acrescido de texto considerado ofensivo ou desabonador. A respeito do tema ponderou o Ministro Ruy Rosado de Aguiar por ocasião do julgamento do Resp nº 46.420/SP: ´Deixando de lado as teorias que procuram de algum modo vincular o direito à imagem a algum outro direito de natureza personalíssimo, como à intimidade, à honra, à privacidade, etc., a doutrina brasileira e a jurisprudência que lentamente se afirma nos tribunais é no sentido de atribuir-lhe caráter de um direito autônomo, incidente sobre um objeto específico, cuja disponibilidade é inteira do seu titular e cuja violação se concretiza com o simples uso não consentido ou autorizado, com as exceções referidas pelos doutrinadores, como a da figura que aparece numa fotografia coletiva, a reprodução da imagem de personalidades notórias, a que é feita para atender a um interesse público, com o fito de informar, ensinar, desenvolver a ciência, manter a ordem pública ou necessária à administração da justiça. No caso dos autos, apesar de serem notórias as figuras dos jogadores, a reprodução de suas imagens não aconteceu em razão do propósito de informar, esclarecer ou atender a algum interesse de ordem pública. Houve a utilização da imagem simplesmente para satisfazer interesse predominantemente comercial, como está no v. acórdão recorrido.
Tratava-se, portanto, de situação sobre a qual incide a regra geral: a reprodução do uso da imagem dependia de consentimento dos titulares, pois o ´uso da imagem de pessoa célebre é totalmente vedado sem o seu consentimento´ (Álvaro Antonio do Cabo e Notaroberto Barbosa, Direito à própria imagem, Saraiva, pág. 82).
Alegou a inexistência de prejuízo, indispensável para o reconhecimento da responsabilidade civil das demandadas. Ocorre que o prejuízo está na própria violação, na utilização do bem que integra o patrimônio jurídico personalismo do titular. Só aí já está o dano moral. Além disso, também poderia ocorrer o dano patrimonial, pela perda dos lucros que tal situação poderia acarretar, seja pela utilização feita pelas demandadas, seja por inviabilizar ou dificultar a participação em outras atividades do gênero. A exigência de demonstração do prejuízo afeiçoa-se aos sistemas em que o direito de imagem está ligado a outros direitos, quando então se torna indispensável o reconhecimento de que o ato de reprodução da figura trouxe prejuízos à honra, à privacidade, etc.
Quando, no entanto, se entende o direito à imagem como um direito que ´por sua própria natureza, opõem-se erga omnes, implicando o dever geral de abstenção´ (Orlando Gomes, Introdução do Dir. Civ., pág. 132), o prejuízo já está na própria violação´ (STJ, 4ª t, J. EM 12/09/1994). O entendimento acima exposto restou cristalizado com a edição da Súmula 403 do Superior Tribunal de Justiça, in verbis: ´Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais´.
Na doutrina pontua Yussef Said Cahali que: ´De regra, portanto, a simples reprodução não consentida de fotografia de uma pessoa com fins comerciais, promocionais, publicitários, com interesse especulativo na difusão de produtos da empresa, revela-se violadora de um bem moral representado pelo direito autônomo da imagem da pessoa, inerente ao seu direito de personalidade; e possibilita, no caso, uma indenização de natureza pecuniária, sem necessidade de qualquer consideração a respeito das repercussões negativas do ato ilícito praticado que se relacionariam, pelas circunstâncias e características da imagem reproduzida, com uma eventual lesão à honra, ao decoro, ao crédito da pessoa, privacidade e outros valores que integram o seu direito da personalidade´ (Dano Moral, 3ª ed., RT, p. 652).
O dano moral decorre do próprio fato, qual seja, a publicação não autorizada de fotografia da autora em revista destinada ao público adulto e em situação que deixaria qualquer mulher, desde que não tenha se proposto a esse fim, em situação embaraçosa e constrangedora. O fato de a autora ser atriz de TV e ter notoriedade não afastam o seu direito à intimidade e ao pudor, salvo se por mera liberalidade abrisse mão disso, o que não ocorreu no caso.
A verba indenizatória deve ser arbitrada de acordo com o prudente arbítrio do julgador, sempre com moderação, tendo em vista que a dor moral não deve se constituir em instrumento de captação de vantagem, nem levar o causador do dano à desestabilidade financeira. Considerando as circunstâncias em que o fato ocorreu, o porte econômico da ré e também que a indenização deve atuar de forma a desestimular práticas semelhantes, reputo justa e razoável uma indenização no valor de R$ 40.000,00. Quanto ao dano material, sendo a ré revista cujo objetivo principal é a veiculação de nudez feminina, por óbvio obteve lucros com a exibição da imagem da autora, mormente em momento em que alcançava grande projeção no meio televisivo, descabendo a alegação de que não houve objetivo comercial na divulgação da foto.
Não há como negar que a divulgação de fotografia de pessoa famosa e de reconhecida beleza, no caso em questão com o corpo parcialmente exposto, tinha objetivos comerciais, não fosse isso não teria a ré interesse em adquirir, mediante pagamento, tais fotos de fotógrafos e empresas que se dedicam a esse comércio. Resultando daí o dano material. Na impossibilidade de acolhimento do valor sugerido pela autora, eis que não se provou que efetivamente foi essa a sua perda, acolhe-se o seu pedido sucessivo (item c.1 - fl. 117), deixando para a fase de liquidação de sentença por arbitramento a apuração do quantum devido. Será considerado para aferição do dano material a remuneração que a ré teria de pagar a um artista com a mesma projeção que a autora tinha à época para posar nas circunstâncias em que se deu a publicação.
Aprecio a lide secundária.
Arguiu a denunciada sua ilegitimidade passiva. Rejeito a preliminar eis que os argumentos contidos na defesa, que em suma versam sobre a interpretação e consequências jurídicas que possam ser extraídas do negócio jurídico entabulado entre a denunciante e denunciada, constituem o cerne da controvérsia, ou seja, se referem ao próprio mérito da denunciação. A fim de se escusar de responsabilidade argumenta a denunciada, dentre outras questões, que o ajuste lhe foi imposto pela litisdenunciante, não tendo oportunidade de discutir suas condições e cláusulas, o que ensejaria a mitigação dos princípios inerentes ao contrato, notadamente o da autonomia da vontade. Tal alegação não convence.
Ora, a denunciada não pode ser considerada pessoa desprotegida e hipossuficiente. Se se predispôs a tirar ou adquirir por qualquer meio fotografia da autora e com o intuito de obter lucro a transferiu para terceiro, agiu por sua conta e risco e deve responder pelo ato, nos termos do contrato. Releve-se, por fim, que se as bases do negócio não lhe eram vantajosas a denunciada tinha plena liberdade para não se vincular, pois ninguém é obrigado a contratar. Mas se o fez, deve arcar com as obrigações assumidas. O direito de regresso, pressuposto básico da denunciação da lide com amparo no inciso III, do artigo 70, decorre da lei ou do contrato.
No que interessa para o desate da controvérsia deduzida na demanda secundária, dispõe o contrato: ´7. Se a (s) OBRA (S) contiverem imagem de pessoa ou obra de arte protegida, o (a) CEDENTE declara estar autorizado (a) pelos respectivos titulares para a criação e exploração da (s) mesma (s) conforme previsto neste Contrato, salvo se o (s) objeto (s) tiver (em) sido fixados ou representados na (s) OBRA (S) a pedido específico da cessionária. 8. O (A) CEDENTE responderá isoladamente pela violação de direitos de terceiros, de qualquer natureza, decorrentes da criação e exploração da (s) OBRA (S) conforme previsto neste Contrato, substituindo a cessionária em todos os procedimentos judiciais e/ou extrajudiciais relacionados, quando possível, caso contrário, reparará todos os prejuízos sofridos pela CESSIONÁRIA´ (fl. 184).
Importa examinar se os termos criação e exploração admitem interpretação extensiva para ai incluir a responsabilidade decorrente da publicação, ato praticado exclusivamente pela denunciante. Advirta-se, desde logo, que a captura de flagrante registrado em fotografia, ato do qual a autora foi vítima, não se confunde com criação protegida pelo direito autoral. A inteligência média não admite que se conclua que por meros R$ 100,00 possa a ré ter adquirido o direito de usar imagem reveladora da intimidade de qualquer pessoa. Se pela bagatela de R$ 100,00 a denunciante obteve não apenas a fotografia, mas inclusive e especialmente a autorização para dar o uso que bem lhe aprouvesse, significa que a denunciada teria adquirido tal direito por valor inferior.
Ora, não se pode imaginar que uma atriz do porte da autora, com a fama e projeção que já desfrutava na época, viesse negociar o uso de sua imagem revelando parte intima do seu corpo por quantia irrisória. Com certeza a ré não desconhece a soma que teria de desembolsar para revelar os segredos do corpo de personalidade do porte da autora nas páginas de sua revista destinada ao deleite do público masculino. Quanto ao termo exploração, também não admite a interpretação elástica extraída pela denunciante. A exploração, aqui entendida no sentido de extrair lucro, compensação material, venda a preço alto e injusto, proveito ou benefício econômico, se refere ao próprio ato de negociação da fotografia, e não ao fim que lhe foi dado por aquele que a adquiriu, a quem coube, com exclusividade, decidir pela publicação, a escolha da mídia a ser utilizada, a contextualização e as circunstâncias em que o faria.
Sobre a interpretação dos contratos destaca-se a lição de Arnoldo Wald: ´O fim econômico, qual seja, a causa do contrato, que se revela pelo estudo das circunstâncias especiais em que foi realizado, correspondendo à occasio legis na interpretação da lei, é fator de grande importância na determinação do sentido das manifestações de vontade das partes (...) A interpretação não deve agravar a situação do devedor, impondo-se uma interpretação restritiva das cláusulas que criam obrigações, pois, na dúvida, a cláusula deve ser entendida no sentido que for menos oneroso para o devedor´ (Obrigações e Contratos, 17ª ed., Saraiva, p. 222).
Insta acrescentar que a insurgência da autora não é propriamente contra o fato de ter sido tirada a fotografia, mas contra a sua publicação, acrescida de texto de conotação sensual e desfigurado do contexto em que a imagem foi captada. Obviamente que a responsabilidade pelo uso indevido da imagem só pode ser atribuída à ré exclusivamente, não se podendo alargar a compreensão do termo ´exploração´ utilizado no contrato, para estender a responsabilidade da denunciada para alcançar também ato de exploração praticado pela ré-denunciante quando optou por publicar a fotografia. Com efeito, não vislumbro nos autos elementos confiáveis que permitam afirmar que a denunciada garantiu a denunciante dos riscos decorrentes do uso e destinação que viesse a dar à fotografia que lhe foi vendida. Pelo o exposto, jugo procedente o pedido para condenar a ré a pagar à autora reparação por dano moral, fixada a verba em R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), corrigidos desta data e com juros a contar da data do evento.
Condeno-a também ao pagamento de indenização por dano material, correspondente à remuneração que teria de pagar a um artista com a mesma projeção que a autora tinha à época para posar para suas páginas nas circunstâncias em que se deu a publicação, cujo montante será apurado em liquidação por arbitramento. Mantenho a decisão de fls. 104/105, que torno definitiva. Custas e honorários advocatícios, que arbitro em 10% (dez por cento) do total da condenação, pela ré. Julgo improcedente a lide secundária.
Condeno a denunciante ao pagamento das custas processuais e honorários devidos ao patrono da denunciada, fixados em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), nos termos do par. 4º, do art. 20, do CPC. P.R.I.
Rio de Janeiro, 12 de Março de 2013.
Katia Cilene da Hora Machado Bugarim
Juíza de Direito
Fonte: www.espacovital.com.br
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